terça-feira, 28 de dezembro de 2010

PURIFICAÇÃO DO CORAÇÃO

PURIFICAÇÃO DO CORAÇÃO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Como Mestre admirável, Jesus mostrou que o que sai de dentro do coração humano é que mancha a pessoa (Mc 7,14-23). Disto resulta a importância vital da purificação interior, situação que envolve o ser humano em tal perfeição que todas as suas ações se tornam realmente luminosas. Trata-se da limpeza moral, apartadas as máculas da consciência, da intenção possibilitando deste modo a iluminação dos sentidos, dos afetos, do espírito, das palavras, das ações. Ficam, então, afastadas todas as imagens ilusórias e, inteiramente, arredado tudo que está condenado no decálogo. O iluminamento que passa a envolver o cristão vem do empenho de uma atitude assumida para poder amar a Deus de todo coração, com toda a alma, com todas as forças, como está preceituado no Deuteronômio (Dt 6,5). É lógico que isto só é possível quando há uma aplicação demorada e absorta da alma nas realidades sobrenaturais o que blinda, resguarda a pessoa contra as invectivas do mal, aumentando a união com o Ser Supremo. Qualquer itinerário ascético-espiritual supõe esta determinação que impede a contaminação exterior. Os meios para que alguém possa atingir tão sublime ideal estão ao alcance de todos, contando que sejam persistentemente cultivados. São eles a participação efetiva e afetiva na Eucaristia, o diálogo com Deus através da oração refletida, a escuta do Espírito Santo, a meditação da Palavra revelada e a energia que vem do exercício constante das virtudes. Esta dinâmica espiritual está ao alcance do batizado, mas nem todos usufruem a mesma. É óbvio que cumpre uma submissão total, irrestrita à vontade divina, o desejo firme de encontrar Deus em sua imediatez, ou seja, na correspondência célere, imediata aos apelos celestiais, dado que a delonga em atender aos mesmos trava a santificação. Foi neste sentido que um grande santo afirmou: “Temo a Jesus que passa e que pode não voltar”. Trata-se de uma reciprocidade, dado que Deus não impõe, mas propõe. A vontade humana não colocando nenhum obstáculo recebe imediatamente da vontade de Deus o impulso para atingir a santidade interior na realização da ordem divina registrada pelo Levítico: “Sede santos, porque Eu sou santo” (Lv 11,44). Portanto, a caminhada de comunhão com Deus exige duplo trabalho: um, ativo, da parte do cristão, com o qual ele, se afastando de todas as imundícies, concentra todo o seu amor em Deus; outro, passivo, exercido pelo Espírito Santo, mas aceito pelo fiel com humildade, paciência e muita dileção. Foi o que conseguiram os grandes santos que identificaram a vontade própria com a vontade de Deus numa ação progressiva dentro das limitações humanas, mas sempre baseados na fé, na esperança e na caridade. Com efeito, a fé purifica a inteligência, a esperança mundifica a memória e o amor depura a vontade. Com a graça correspondida é possível a todo batizado, que assim procede, se desapega até do pecado venial, do apego às coisas inúteis ou perigosas, desembaraçando-se de qualquer empecilho que possa impedir a entrada da luz celestial dentro de sua alma. Esta atitude de qualquer batizado foi preconizada por São Paulo de uma maneira admirável ao escrever aos Colossenses: “Uma vez, pois, que ressuscitastes com Cristo, procurai as coisas lá de cima, onde Cristo está assentado à direita de Deus; interessai-vos pelas coisas do alto, não pelas coisas terrenas, desde que vós morrestes, e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus” (Cl 3,1). Esta é uma tarefa que dura toda a existência nesta terra e supõe muita determinação. A vigilância impede que as ervas daninhas floresçam dentro do coração e, com a proteção divina, se pode erradicá-las quando tentam germinar. Com efeito, o amor próprio e o apego desordenado às comodidades da existência não morre nunca e coloca o cristão continuamente à prova. Como grande é a fraqueza humana cumpre ao seguidor de Cristo saber inclusive conviver com suas falhas, pois somente Deus é perfeito e o salmista assim se dirigiu a Ele: “Senhor, se observardes as nossas culpas, quem poderá subsistir?” (Sl 129,3). A busca da santidade, de fato, não corresponde a um perfeccionismo doentio, mórbido, hipocondríaco, isto é, a uma tendência obsessivamente exagerada para atingir a perfeição, mas inclui a consciência da precariedade do ser humano falível, que é capaz de reconhecer seus percalços sem se acomodar aos mesmos. É assim que se evita a opacidade, mesmo porque célebre é o adágio: “Errar é humano, perseverar no erro é diabólico”. Na alheta de São Paulo (Rm 8,28) se pode dizer que para aqueles que amam a Deus tudo coopera para o bem, até mesmo suas falhas. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário