terça-feira, 23 de novembro de 2010

FICAI PREPARADOS

FICAI PREPARADOS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Um alerta de Cristo que deve sempre ser recordado é este: “Ficai preparados, porque o Filho do homem vai chegar na hora em que menos o esperardes” (Lc 12,40). Esta advertência do Mestre divino imerge a alma no oceano da esperança. Isto significa verificar o dinamismo da vida espiritual, a fecundidade das próprias opções, é deixar de lado a lógica da eficácia tão falaz dos recursos humanos e colocar a vida na ótica da eternidade. O encontro com Cristo após a trajetória terrena do batizado é uma decisão que se opõe frontalmente ao poder da morte. É uma orientação para o porvir, porque o amanhã trará a realização plena dos mais recrescentes anelos humanos. Aquele que vive em plenitude o momento presente faz de sua fé uma dedução vivencial, está sempre vigilante à espera do seu Senhor, quando este vier segundo os planos eternos de Deus para cada um. Como ensinou Santo Agostinho, o que se aguarda é simplesmente a felicidade total no seio de Deus, ainda que não se tenha um conhecimento abrangente do que há de ser esta sublime realidade, mas se possui certeza absoluta que será uma imersão definitiva naquele oceano infinito de amor que é o Ser Supremo. Cumpre, portanto, estar atentos na paciência e na disponibilidade à vontade divina. É ter sempre as lâmpadas acesas alimentadas pelo óleo de uma grande dileção a Deus, a qual deve enfronhar os mínimos atos da vida cristã. Este está convencido da assertiva de São Pedro ao afirmar que quando aparecer o supremo Pastor receberá a coroa imperecível da glória (1 Pd 5,4). Foi assim que agiram e viveram os santos. O Papa Bento XVI, na sua encíclica sobre a esperança, fala de Josefina Bakhita, africana que viveu no século XIX e foi canonizada por João Paulo II. Ela sofreu as maiores atrocidades, mas estava firme em Deus seu “Parron”, como falava no seu dialeto, ou seja, o Deus vivo, o Deus de Jesus Cristo. Santa Terezinha de Lisieux cantou a misericórdia divina e levou a esperança ao seu limite por entre os sofrimentos do corpo e da alma, padecendo as angústias mais horripilas. Em vão o demônio a quis lançar na desesperança. Ela meditava e mentalizava o que ensinou São João da Cruz: “Deus aumenta de tal forma a esperança de uma alma que sem cessar se volta para Ele, sem jamais abaixar os olhos para outro objeto e isto de tal forma que bem se pode verdadeiramente dela dizer: ela obtém tudo na medida em que ela espera confiante”. A confiança era a característica de Santa Terezinha que repetia sempre: “É confiança e unicamente a confiança que deve nos conduzir ao amor”. Na trilha desta santa se colocou Madelein Delbrel, assistente social muito ativa em Ivry-sur Seine que era uma municipalidade comunista no século passado. Ela proclamava: “A esperança cristã cria em nós a capacidade de desejar e de receber o que por nós mesmos não poderíamos nem desejar receber, nem mesmo conhecer. A esperança é como a incessante respiração da alma que almeja um dia estar com Deus por toda a eternidade [g...] A esperança cristã espera em Jesus Cristo, espera em Deus. A esperança tem uma atividade e uma eficácia prodigiosas. Ela nos permite através de lutas, de esforços, de trabalhos ínfimos, transformar as circunstâncias ou os acontecimentos de nossa vida em acontecimentos eternos”. De fato, esta virtude faz com que se esteja sempre vigilante como advertiu de Jesus. Deste modo, o cristão não conhecendo a morte espiritual, se prepara para o beatífico encontro com Deus. Encontra energias novas e nunca resvala para a rotina. A esperança se liga assim à fé como se pode captar na existência dos grandes testemunhos da Bíblia como Abraão, a Virgem Maria, São Paulo. Eles atingiram a vigilância epistêmica, ou seja, aplicaram atenção cuidadosa sobre os conhecimentos advindos da revelação divina e as inspirações do Divino Espírito Santo, evitando o condicionamento das insinuações do mundo e do demônio. Desta maneira, não se deixaram enganar, permanecendo atentos, vigilantes diante de Deus. Não permitiram a alienação pela influência do egoísmo e permaneceram fiéis aos ditames de sua consciência jamais adormecida. Exercer o cuidado vigilante é um fator de sobrevivência espiritual. Ao ensinar aos seus discípulos “Ficai preparados” Jesus agiu como um admirável mestre, indicando uma atitude filosófica e teológica de grande valia. O cristão em seu relacionamento interpessoal lá no íntimo de seu coração precisa continuamente estar consciente de que se acha plenamente preparado para entrar no Reino dos céus. Isto afastará qualquer acomodação, qualquer ausência de vontade de crescer espiritualmente. Leva a redescobrir, ininterruptamente, o agir de Deus e conduz a uma completa adesão aos seus desígnios, numa comunhão absoluta com o Absoluto. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

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