O TRISTE LEGADO DO SÉCULO XX
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
O século passado foi marcado pela seqüência infausta de guerras, conflitos, genocídios, “limpezas étnicas”, que ocasionaram horrípilos sofrimentos. Tempos, indiscutivelmente, de barbárie, de atrocidades inéditas. Em 141 países dos 185 que fazem parte das Nações Unidas se verificam violações dos direitos humanos, cometidas por governos e grupos armados de oposição. Aberrações como tortura, homicídios praticados por agentes do Estado, desaparecimentos e encarceramento de presos por causa de motivos ideológicos. Os direitos femininos foram, em muitos países, desrespeitados nos campos econômico, social e educacional. Multiplicaram-se a violência doméstica, os estrupos, o tráfico de mulheres, a esterilização em massa, uma campanha sórdida a favor do aborto, além da disparidade na remuneração salarial, pois a participação feminina no rendimento do trabalho foi de 34,4% e a dos homens 65,5%, o que revela uma injustiça fragrante. Acrescente-se que nos Estados Unidos uma mulher foi espancada a cada 18 minutos.
Tudo isto causado pela falta de compreensão entre os homens, luta injusta entre as diversas classes sociais, desmedida ambição dos bens terrenos, prepotência levada às raias da mais completa irracionalidade.
Todos estes conflitos ocasionaram torrentes de paixões, as quais se desencadearam acirrando ainda mais os ânimos, lançando os homens bem longe do projeto traçado por Cristo.
Na Primeira Guerra Mundial de 1914 a 1918 imperou uma selvajaria brutal nunca dantes vista: vinte milhões de mortos nos bombardeios aéreos, nos massacres, e também pela fome, pelas epidemias. Trágico balanço final, além do empobrecimento de todos os participantes desta guerra inglória e das tensões e agitações sociais que se seguiram.
A humanidade, porém, não tirou lições da magna catástrofe. Continuou ignorando o preceito de amor do Cenáculo e de 1939 a 1945 o século XX presenciaria o mais sangrento confronto bélico de toda a História numa Segunda Guerra Mundial. Houve o Holocausto, milhões de judeus impiedosamente assassinados pelos nazistas. O lançamento da Bomba Atômica arrasou Nagazaki e Hiroshima. A causa primordial continuou sendo a mesma denunciada pelos papas: o desamor entre os homens, a ganância pairando acima de todos os interesses. 50 milhões de mortos foi o saldo lastimável desta conflagração. A destruição material foi alarmante, atingindo principalmente a Polônia, a Rússia, a Iugoslávia e a Alemanha. Uma horrível crise moral se abateu sobre a Europa: clima de desespero, de angústia, de desilusão.
Os desmandos, porém, não teriam fim nem com tantas conseqüências fatídicas. O mundo pós-guerra continuou assistindo desentendimentos e por pouco não viria o fim dos tempos com uma guerra nuclear que selaria a sorte deste planeta.
A chamada Guerra Fria, resultado da disputa de áreas de influência em toda parte pelo bloco socialista e pelo bloco capitalista lançou o mundo num período de grandes perturbações de 1946 até 1991.
Os conflitos regionais, porém, continuaram manchando o século XX, mostrando-o à margem da doutrina do Cenáculo. A emancipação política na África, Ásia de Oceania foi geralmente marcada por terríveis derramamentos de sangue e, em seguida, maculada com tremendas lutas fratricidas, por exemplo, entre as tribos africanas. Um milhão de pessoas cruzou a fronteira de Ruanda em julho de 1994 em direção ao Zaire para fugir da guerra civil entre as etnias hutu e tutsi que devastava o país. Este, um fato entre tantos outros.
Surgiu na Ásia o grande líder indiano, mas de espírito cristão, Mahatma Gandhi que pregava a não-violência ativa, mas ele acabou sendo assassinado. Vieram depois a Guerra da Coréia, do Vietnã, sendo que nesta última, que assinalou um dos grandes vexames norte-americanos da História, 60 mil soldados dos EUA foram mortos, além de um gasto de 150 bilhões de dólares que dariam para matar a fome de tantos famintos.
Aditem-se os conflitos árabe-israelense, a luta entre o Irã e o Iraque, a Guerra do Iraque, os massacres no Kosovo, e mais recentemente a guerra na Chechênia nos confins do Cáucaso com mais mortes e destruições e se concluirá que o século XX foi marcado pelo ódio e não pelo amor que, um dia, Cristo pregou no Cenáculo.
Estas lutas fizeram mais de 18 milhões de refugiados que buscaram abrigo em outras nações, aumentando ainda mais os sofrimentos humanos, pois são pessoas que perderam tudo: casa, terras, emprego, dignidade. Não contam com a proteção de um Estado pois estão fora de suas comunidades primitivas e ficam sujeitos a todo tipo de discriminação, abuso e violência. De fato, como encontrar asilo conveniente para estes milhões de seres humanos deserdados pelas guerras! Multiplicam-se então os campos de refugiados na África e na Ásia onde a vida é subumana. Por fim a explosão do racismo no mundo foi uma demonstração de desrespeito à dignidade da pessoa humana, racismo a fazer vítimas e mais vítimas, sendo uma das mais notáveis Martin Luter King, assassinado dia 14 de abril de 1968 nos EUA por ter lutado pelo direitos civis da população negra e contra a negligência dos poderosos diante dos problemas dos mais pobres.
Uma questão, porém, se levanta: será que as perspectivas do século XXI nos permitem entrever um mundo melhor? * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.
segunda-feira, 8 de março de 2010
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