NÃO TENHAIS MEDO

NÃO TENHAIS MEDO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Palavras maravilhosas de Jesus a seus discípulos registrou São Marcos: “Coragem, sou eu! Não tenhais medo!” (Mc 6,50). Jesus empregou várias vezes esta palavra “coragem” que significa ausência de temor, ânimo, denodo. Assim é, por exemplo, certa ocasião “eis que lhe apresentaram um paralítico estendido numa padiola. Jesus, vendo a fé daquela gente, disse ao paralítico: "Meu filho, coragem! Teus pecados te são perdoados” (Mt 9,2). Afirmou também aos apóstolos: “Referi-vos essas coisas para que tenhais a paz em mim. No mundo haveis de ter aflições. Coragem! Eu venci o mundo” (Jo 16,33). Os discípulos de Cristo assimilaram bem as palavras do Mestre. Assim é que levados perante o Sinédrio, “vendo eles a coragem de Pedro e de João, e considerando que eram homens sem estudo e sem instrução, admiravam-se. Reconheciam-nos como companheiros de Jesus” (Atos 4,12). Não só Pedro e João, mas “com grande coragem os apóstolos davam testemunho da ressurreição do Senhor Jesus. Em todos eles era grande a graça” (Atos 4,33). A coragem cristã flui, portanto, de uma entrega total a Jesus no qual se deposita a mais completa fé que gera a certeza de uma proteção poderosa, pois nele se pode acreditar. Ao depositar suas esperanças nele o coração humano se torna impávido para enfrentar todas as dificuldades, visando a própria santificação. A alma passa a comunicar ao Mestre divino todos os seus segredos, abre-lhe todas as comportas de seu ser e desta conexão cordial resulta a imperturbabilidade. Quem percorre com atenção a Bíblia percebe que o destemor ligado à fé resulta, assim, do conhecimento do poder do Redentor dos homens. Liga-se, outrossim, à esperança que afasta todo tipo de dúvida, de incerteza, de pusilanimidade. Tudo isto, é claro, envelopado num grande amor que alimenta as atitudes mais intrépidas. Tudo isto leva a uma obediência completa às inspirações divinas, pois o fiel com sua tranqüilidade psicossomática se torna apto à obediências às mesmas, certo de que “todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a Deus,” (Rm 8,28). Aliás, São João asseverou: “No amor não há medo, o amor perfeito, antes, expulsa o termor, porque o medo traz consigo uma aflição; e quem tem medo, não é perfeito no amor” (1 Jo 4,18). Imerso neste amor, iluminado por esta esperança, firmado numa fé robusta o cristão enfrenta com galhardia as turbulências espirituais e corporais. Em conseqüência se dá entre Deus e a alma uma comunicação que fortalece e robustece a coragem do ser humano. Ao se refletir sobre os grandes acontecimentos bíblicos se percebe que Deus que se revela é um Deus que passa aos homens seus planos, seus projetos como ocorreu com Abraão, com Moisés que ficou 40 dias em tertúlia com o Onipotente, com os grandes Profetas e, depois, através de Jesus a transmitir aos Apóstolos o que ele pensava do Reino de Deus e como agir no mundo.O Ser Supremo se manifesta como aquele que faz confidências aos homens e as torna participantes de seus segredos. Ora, se assim é, aquele que crê deve fazer de seu Senhor o grande confidente, persistentemente solicitando as luzes divinas e a repetir sempre: “Senhor, vossa graça me basta, é ela que eu imploro”. Ele é o guia iluminado e sábio. Ele tudo conhece, tudo sabe, mas quer que lhe exponhamos todas as minúcias de nossa vida e lhe entreguemos todas as nossas preocupações. Quando Eva confiou mais na serpente do que no Criador a catástrofe foi sem limites e o pecado entrou no mundo. Foi a maior tragédia que se deu na história humana. Cumpre, portanto, acolher sempre as inspirações de Deus e aí (Sl 94, 8) está a razão da advertência do salmista: “Oxalá escutásseis hoje a sua voz:”: Não endureçais o vosso coração, como em Meribá, como no dia de Massa, no deserto”. Jeremias então proclama: Bendito aquele que confia em Deus, e no Senhor tem a sua segurança” (Jr 17,7). Em virtude desta confiança absoluta o fiel sabe ler os acontecimentos de sua existência e tira das provações de cada hora mais força para fazer a vontade de seu Senhor. Seu único apoio é Aquele que tudo pode e do qual se deve depender em tudo. É deste modo que se passa do mal para o bem, das trevas para a luz. Deus quer ser visto como Pai amoroso e nada mais beatificante do que repousar nas suas mãos poderosas. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.