quarta-feira, 22 de abril de 2009

UM REPUBLICANO CONVICTO

UM REPUBLICANO CONVICTO

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Nos Autos de Devassa da Conjuração Mineira se lê o seguinte: “O Doutor Cláudio Manoel da Costa era o sujeito em casa de quem se tratou de algumas cousas respeitantes à sublevação uma das quais foi a respeito da Bandeira e algumas determinações do modo de reger da República: o sócio Vigário da Villa de São José é quem declara nas perguntas formalmente; o mais, que há fora disto, são indícios e ditos de ouvido...”. O ideal republicano que raiou na América do Norte muito influenciou os conjurados tanto que, quando se tratou da bandeira “em casa do Dr. Cláudio Manuel da Costa também o caso foi abordado, lembrando-se este da bandeira americana, dizendo que esta tinha como símbolo um gênio quebrando grilhões com a inscrição: Libertas aequo spiritu e que podia perfeitamente servir para a nova república. Não concordou Alvarenga, pelo que o Dr. Cláudio propôs outra inscrição Aut libertas aut nihil ...”. Na sentença que o desembargador Francisco Luiz Álvares da Rocha levou 18 horas a redigir e que leu na sala do Oratório dia 18 de abril de 1792, se diz que Cláudio Manoel da Costa “soube e teve individual notícia e certeza de que estava ajustado entre os chefes da conjuração fazer-se o motim e levante, estabelecer-se uma república independente na capitania de Minas, proferindo o seu voto nesta matéria nas torpes execrandas conferências que teve com o réu Alvarenga e o padre Carlos Correia Toledo, tanto na própria casa, como na casa de Tomás Antônio Gonzaga ... em cujas conferências se tratava do modo de executar a sedição e levante, e dos meios do estabelecimento da república, chegando a ponto do réu votar sobre a bandeira e armas de que se devia usar”. Para essa república Cláudio Manoel da Costa com o Côn. Vieira e Gonzaga havia leis que eram sumamente humanitárias, democráticas, igualitárias. É o que revelam os Autos de Devassa: “O Dr. Cláudio e Côn. Luiz Vieira e o Desembargador Gonzaga já tinham feito as leis para se governarem, nas quais se ordenava que todo o homem plebeu pudesse vestir cetins; que os diamantes fossem francos; que os dízimos fossem para os Vigários com condição de sustentarem uns tantos mestres, hospitais e outras coisas pias; aquele que mais se distinguisse na primeira ação seria o mais premiado; e que a nação que primeiro os socorresse durante a guerra, essa teria mais vantagens em seus portos. Esta república “constaria de Sete Parlamentos, sendo a capital a Vila de São João d’El Rei, em que se havia de fundar uma Universidade como a de Coimbra...” Além disto “nos primeiros três anos serviriam os eleitos; e depois iriam servindo os mais anualmente”. República eminentemente popular. Era a grande guinada que Cláudio e seus companheiros davam na história de então, bem compreendendo que os tempos exigiam um regime que obstaculizasse a tirania. Assim deixaram uma marca indelével em todo o pensamento liberal brasileiro, iniciando decisivamente o processo anti-tirânico que não mais seria detido. Razão tem Brasil Gerson ao declarar que os conjurados de 1789 haviam arquitetado algo de sério e muito bem fundamentado: “...a revolução não era uma cartada no escuro, jogada por sonhadores: era alguma coisa de prático, de eficiente, destinada a um êxito completo”. Aliás Lúcio José dos Santos sintetizou magistralmente: “Esta tentativa assumiu uma forma perfeitamente definida, teve um objetivo preciso e exeqüível, possuiu elementos capazes de conduzi-la a realizações práticas”. Cumpre a muitos livros de História rever suas assertivas sobre a Conjuração Mineira, que foi, sem dúvida, um movimento patriótico com um ideário programático admirável. É preciso, de fato, embasar sempre as assertivas numa verdadeira filosofia dos eventos, na cosmovisão dos personagens, ou eles poderiam até figurar como meros ambiciosos, maus pagadores de impostos, simples agitadores, reacionários românticos, ou desocupados e utópicos literatos. Suas reuniões não passariam de “cochichos de inconformados”, que não elevaram seu ideal às alturas de uma concreta ação social, como ainda se lê em alguns historiadores mal informados ou mal formados. * Professor no Seminário de Mariana de 1967 a 2008.

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