segunda-feira, 13 de outubro de 2014

DAR A DEUS O QUE É DE DEUS

DAR A DEUS O QUE É DE DEUS Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho* Quando Jesus declara que é preciso dar a Deus o que é de Deus, cumpre, em primeiro lugar, ressaltar que o Mestre Divino não se aparta com isto do terreno social ou econômico da vida dos homens. Como bem mostrou o Pe. Jean-Francois Berjonneau, se Ele se incarnou na história dos homens, foi para assumir toda a humanidade de seus irmãos. Ele é o Filho deste Deus que, na aurora da história de Israel, demonstrou sua compaixão diante do infortúnio dos que padeciam: “Eu vi, eu contemplei a miséria de meu povo que está no Egito. Eu escutei seu clamor diante de seus opressores. Sim, eu conheço suas angústias. Eu desci para libertá-lo (Ex 3,7). Jesus é, portanto, a manifestação em nossa humanidade deste Deus Misericordioso, que conhece o cerne da desdita de cada criatura humana, sua inquietude por não saber o que será o dia de amanhã, que experimenta tantas vezes a solidão ao se sentir abandonado e desprezado. O Verbo de Deus se encarnou, entretanto. para libertar de todos os males. Assim ele definiu sua missão em Nazaré: “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou com a unção para levar a Boa Nova aos pobres. Ele me enviou para anunciar aos prisioneiros a libertação e o dom da vista aos cegos, para por em liberdade os oprimidos” (Lc 4,18-19). A trajetória de Jesus na história dos homens passa por uma liberação efetiva e concreta de toda opressão para que cada pessoa possa reconhecer o amor com que ele é amado pelo seu Criador. Assim sendo, o poder de César, ou seja, da autoridade civil, está submetida a um juízo crítico essencial de justiça e equidade, pois, como dirá depois Jesus a Pilatos, este poder vem do alto. Deste modo, ao dizer que se devia dar a César o que é de César, está implícito que o poder público devia se colocar ao serviço da dignidade de cada ser humano na sua integralidade e de todos os homens na sua igualdade e sua unidade. Os impostos pagos ao governo precisariam sempre ser aplicados responsavelmente a favor do povo e não para enriquecer os políticos com exclusão, inclusive, dos mais necessitados. A promoção destes cumpre esteja sempre na linha libertária desejada por Deus. Cuidado com os que têm fome, com os doentes. Defesa intransigente dos direitos de cada cidadão na vivência de uma solidariedade sem limites. Entretanto, quando se aprofunda a ordem lapídar de Jesus de dar a Deus o que é de Deus. se percebe a necessidade de lhe consagrar a pessoa humana por inteiro, o que leva cada um a estar a serviço do próximo, dado que todos somos filhos deste Deus misericordioso. Daí a luta constante para que cada um atinja toda a sua grandeza humana, toda a sua dignidade. Isto conduz a se desapegar dos falsos ídolos e, entre eles, a adoração dos prazeres ilícitos. O Pe. Raniero Cantalamessa observa então que o reino de Deus não é deste mundo e é preciso cuidar da soberania espiritual deste Deus dentro de cada um e por toda parte. O cristão não pode ficar indiferente a esta realidade sublime. Por isto mesmo, se ele deve obedecer às autoridades civis, precisa, porém, resistir quando o Estado se coloca contra Deus, por exemplo, no caso do aborto, das aberrações sexuais e tantos outros desvios contrários ao Decálogo. Antes de obedecer aos homens é preciso obedecer a Deus. Nem se pode, porém, esquecer que na sentença “dar a César o que é de César” está incluída a obrigação de se pagar em dia os impostos. O cidadão, contudo, tem por obrigação reivindicar que os mesmos sejam bem aplicados. Esta é a contrapartida que o Estado deve aos habitantes de sua circunscrição. Por isto os governantes devem ser justos e equitativos nos seus critérios de emprego do dinheiro público. Haveria desta forma um mundo muito mais humano se cada um desse a “Deus o que é de Deus e a César o que é de César”. Os cristãos contribuiriam muito mais nas construção de uma sociedade justa e pacifica na promoção inteligente dos valores comuns como a família, a defesa da vida, a solidariedade com os marginalizados. Existiria muito mais senso crítico na escolha dos políticos, sendo banidos os oportunisstas e respeitadas as relações entre os partidos. Em síntese, a observância integral dos mandamentos, o respeito ao próximo, a capacidade de autocrítica, a honestidade são elementos que um seguidor de Cristo tem obrigação de ostentar e levar a todos os domínios da religião e da política. O Pe. Yvon Michel Allard, alerta que se cada um deve dar a Deus o que é de Deus, muitos governos pelo mundo a fora se esquecem de que eles precisam respeitar os direitos divinos, manipulam a religião de acordo com seus próprios interesses e impõem a sua ideologia. Surgem entraves sérios à obra missionária da Igreja. Num contexto pluralista há governantes que atropelam os valores cristãos e continuamente, sobretudo, os Papas têm lutado bravamente para que se dê a Deus o que é de Deus. Seja como for, mister se faz que haja por toda parte o discernimento perfeito do que é “dar a Deus o que é de Deus e a César o que é de César”, visando um mundo melhor em todos os sentidos. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos

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