quarta-feira, 23 de junho de 2010

O CRISTÃO PERANTE DEUS

O CRISTÃO PERANTE DEUS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Perante Deus o cristão deve ter uma indiferença inaciana diante do mundo exterior. Não se trata da adiáfora dos estóicos que era propriamente insensibilidade, que redundava em orgulho e soberba. Para os seguidores de Zenão havia uma ascese ou um exercício destinado a elevar o homem natural acima de todas as vicissitudes da sorte num enfrentamento da dor sem nenhum sentido.
O cristão não pode ser indiferente perante as coisas que em si conduzem a Deus. Os espinhos da vida podem e devem ser transformados em pérolas para a eternidade.
Têm uma função purificadora para quem se une ao Divino Crucificado do Gólgota. O epígono de Cristo não cultiva a apatia para com as coisas que de per si afastam de Deus, pois estas devem causar repulsa toda da vontade, por muito gratas que sejam.
Não aceita a impassibilidade perante aquilo que é mandado ou proibido por Deus, mas dá adesão ao primeiro e repulsa do segundo, aconteça o que acontecer. Em síntese, a vontade do autêntico discípulo do Evangelho se resolve unicamente em vista do maior serviço de Deus e do acatamento de sua vontade num total descanso, isto sim, na Providência divina. Não se trata de suprimir a sensibilidade, mas em a vencer sempre. Não é insensibilidade na parte espontânea do desejo e do apetite, mas indiferença na faculdade livre, racional, ou seja, na vontade que se submete inteiramente a Deus. Portanto o cristão não permite que os movimentos do afeto, do apetite, do desejo entrem na linha dos movimentos determinantes da vontade. Portanto a indiferença cristã recai em tudo o que é concedido à liberdade do livre arbítrio, isto é, o cristão não se perturba nunca porque contempla em tudo que lhe acontece ou vai acontecer o desígnio do Todo-poderoso Senhor no qual confia inteiramente. Repete com o salmista: “Ainda que eu passe pelo vale da morte, nada temerei” (Sl 22). Isto é ser verdadeiramente livre por não se deixar escravizar pelos acontecimentos, pelo apego natural às coisas que se possui ou que se venha a perder.
É domínio sagrado da vontade sobre o que se tem e sobre o que não se tem, para que a vontade esteja sempre, sem limites nem condições ao serviço de Deus numa tranqüilidade que facilita inteiramente a oração.
Está tranqüilo quem deste modo procede, pois nem a saúde ou a doença ou a riqueza, ou a pobreza, ou a honra, ou a desonra ou a vida longa, ou a existência curta, nada disto pode perturbar quem se coloca totalmente sob a égide do Ser Supremo.
As antíteses valorativas acima passam a não preocupar, pois se sabe que Deus é quem conhece o que é melhor para cada um. Dentro desta perspectiva a morte sempre se apresenta para o cristão como um suave sono do qual se passa para as alegrias perenes preparadas por Deus para quem lhe foi fiel nesta terra de exílio.
*Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

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