sábado, 8 de maio de 2010

AS TENTAÇÕES DE JESUS

AS TENTAÇÕES DE JESUS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Cada ano, a liturgia primeiro domingo da quaresma conduz os cristãos ao deserto onde se dão as tentações permitidas pelo Filho de Deus, objetivando fornecer lições preciosas para um combate sempre recomeçado (Lc 4,1-13). Esta luta contra o espírito das trevas é mais árdua que as batalhas militares, pois se trata de uma pugna contra as forças infernais. Note-se, de início, o que registrou São Lucas: “Jesus, cheio do Espírito Santo, voltou ao Jordão e, no deserto, ele era guiado pelo Espírito”. (v 1). Foi ao deserto que Deus quis também conduzir Abraão, Moisés e os profetas para concluir com eles uma aliança eterna. É a este tempo do deserto que o Deuteronômio faz referência, relatando o que Moisés dizia ao povo de Israel sobre as maravilhas operadas pelo Todo-Poderoso que os libertara do jugo egípcio. É no deserto que melhor se escuta o Ser Supremo: “A palavra está perto de ti, em tua boca e no teu coração, para a coloques em prática” (Dt 30,14). Foi num deserto que Jesus se refugiou para estar em íntima tertúlia com o Pai e para vencer o diabo. Cumpre a todo cristão entrar muitas vezes no mais profundo de si mesmo, longe do bulício do mundo para dialogar com Deus, escutá-lo e se fortificar para vencer as artimanhas do inimigo. Este, que não venceu a Cristo, quer derrotar os seguidores do Redentor. Toda a existência humana é um combate contínuo contra satanás e já advertia São Pedro: “Sede sóbrios e vigiai. Vosso adversário, o demônio, anda ao redor de vós como o leão que ruge, buscando a quem devorar. Resisti-lhe fortes na fé” (1 Pd 5, 8-9). Santo Agostinho explica que nesta trajetória terrena “nossa vida não pode escapar à prova da tentação, porque nosso progresso se realiza através da provação. Ninguém se conhece sem ter sido experimentado, e não pode ser coroado sem ter vencido, não pode vencer sem ter combatido e não pode combater se não se encontra com o inimigo e suas tentações”. Eis por que na oração do Pai Nosso se pede a Deus: “Não nos deixeis cair em tentação”. A primeira provação de Cristo no deserto remonta ao que ocorreu no Paraíso pois concerne ao alimento (Gn 3,3). Adão e Eva caíram nas garras do maligno, Jesus, porém, prontamente o rechaça: “Não é só de pão que vive o homem”. Como bem explicou Santo Irineu, “a saciedade que o homem conheceu pelo alimento foi destruída pela privação que o homem Jesus sofreu neste mundo”. A gula incentivada pela mídia continua a ser um dos pecados capitais que causam tantos males corporais e espirituais! Já São João Crisóstomo alertava, numa frase que se tornou antológica, que “a gula mata mais do que a espada”. Ao triunfar da segunda tentativa do diabo, que quer sempre tomar o lugar de Deus e ser adorado, Jesus deixa mais uma lição maravilhosa: “Adorarás o Senhor teu Deus e só a ele servirás”. O homem aliciado pelo espírito do mal se julga sempre mais sábio do que o Ser Supremo, desprezando os mandamentos, preterindo o seu Senhor para aderir aos falsos ídolos apresentados pelo pai da mentira e seus sequazes. Na terceira tentação afastada logo por Cristo ele alerta para o combate do desejo do maravilhoso, do miraculoso. O demônio queria que Jesus, usando seus poderes divinos se precipitasse do alto do templo e que os anjos viessem para socorrê-lo. Quantas vezes, por insinuação diabólica, se fazem a Deus os pedidos mais absurdos, muitos esquecidos da veracidade do axioma: “Ajuda-te que o céu te ajudará”! Em Jesus se contempla o homem inteiramente livre que não se dobra a satanás. Santo Agostinho bem mostrou que, de fato, Cristo foi tentado pelo diabo, mas nele é cada ser humano que foi tentado nos diz o grande teólogo: “Cristo tinha de ti a sua carne, para te dar a salvação; tinha de ti a tentação para te dar a vitória. Se é nele que somos tentados, é nele que dominamos o diabo.[...] Entretanto, se ele não tivesse sido tentado, não teria te ensinado, a ti, que deves ser submetido à tentação, como se obtém a vitória”. De fato, com satanás e suas insídias cumpre sempre afugentamento imediato. * Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário