domingo, 14 de fevereiro de 2010

Viver as bem-aventuranças

VIVER AS BEM-AVENTURANÇAS
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
As bem-aventuranças apresentadas por São Lucas (Lc 6, 20-26) menos numerosas que as oito do Evangelho de São Mateus (5 3-11), oferecem, elas também, acesso ao reino de Deus. São Lucas acrescenta quatro advertências, chamando a atenção dos que não praticam o que Jesus acaba de ensinar. De plano, o Mestre divino apresenta a pobreza como um dom. Trata-se de uma atitude contrária ao materialismo e ao consumismo, características, aliás, sobretudo da atual sociedade pós-moderna. Esta, com efeito, mede o valor da pessoa humana por aquilo que ela possui e não por aquilo que cada um é. O ter passa a ser o referencial primordial e não o ser e o viver intensamente a existência no dia a dia desta passagem por este mundo onde tudo é transitório. Há uma tendência no contexto hodierno que leva as pessoas a acumular mais e mais e a fazer dos bens materiais o fim último de sua vida. A virtude da pobreza leva a se desapegar dos bens terrenos para se aproximar mais intimamente de Deus, depositando total confiança na Sua providência. O que se possui passa a ser considerado apenas como um meio para a própria subsistência e do próximo, sem menoscabar a previdência para as contingências futuras. O cristão firma-se na certeza de que fazendo o que está a seu alcance não terá falta do mínimo necessário para sua sobrevivência, uma vez que o espírito de pobreza não coincide com a indolência, mas, isto sim, evita o endeusamento do que é supérfluo. Esta postura dá segurança total a quem confia em Deus, doador de todos os bens. Cristo, porém, acrescenta que há necessidade de fome da justiça, ou seja, de se procurar auxílio não nas coisas deste mundo, não nos seres humanos, mas somente em Deus, como mostrou São Paulo aos Coríntios, pois Ele é o “Deus de toda consolação que nos consola em todas as aflições” (2 Cor 1,3). Os que, porém, assim agem são perseguidos pelas forças do mal que campeiam por toda parte, sobretudo nos meios de comunicação social que pregam valores contrários aos ensinamentos de Jesus. Quantos, infelizmente, vão fazendo concessões às idéias perniciosas, temendo contradizer o mundo e seus comparsas. Entretanto, a fé deve se opor a tudo que é o mal na cultura hodierna. Cumpre escolher, ainda que penosamente, entre o que é agradável a Deus ou o que é simplesmente contentar os que vivem o espírito mundano. Quantas pessoas piedosas, cumpridoras de seus deveres se tornam objeto de mofa em casa, no local de trabalho, na sociedade em geral! Os mandamentos divinos precisam, contudo, ser a prioridade na existência do verdadeiro cristão, ainda que desagrade com sua conduta que é, de si, um protesto contra a dissolução dos costumes. Para a fidelidade e perseverança, é preciso, entretanto, a vitória sobre o egoísmo e amar, mais e mais, a Deus e O servir com alegria. Não basta ser fiel apenas nas pequenas tarefas diárias, mas, outrossim, diante das exigências da fé. É preciso cumprir com os deveres religiosos, profissionais, familiares sem a preocupação com a opinião dos outros. Mister se faz estar certo de que o mundo, como bem se expressou Santo Agostinho, “apresenta duplo exército contra os discípulos de Cristo: afaga para seduzir, apavora para quebrar”. Ecoam, porém, as palavras de Jesus: “Referi-vos essas coisas para que tenhais a paz em mim. No mundo haveis de ter aflições. Coragem! Eu venci o mundo” (Jo 16,33). É deste modo que se vivem as bem-aventuranças. Adite-se que é muito importante também iniciar cada dia com renovado otimismo, confiado na graça divina. Fazer do dever de cada hora uma prece implícita a Deus. Ser cortês, amável e gentil durante todo o dia e com todas as pessoas. É desta maneira que se vive a pobreza de espírito, que se tem fome da justiça, que se abraça o sofrimento enviado por Deus, sem se importar com o juízo dos homens. Grande há de ser então o júbilo de cada um, certo de que será grande a recompensa no céu! Não basta, portanto, estar cristão, mas, sim, ser, de fato, cristão! Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.


.

.

Nenhum comentário:

Postar um comentário