terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

UM CORAÇÃO PURO

UM CORAÇÃO PURO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
A advertência de Cristo foi clara: “É de dentro do coração humano que saem as más intenções” (Mc 7,21). A recíproca é, em conseqüência, verdadeira: é lá de um íntimo puro que fluem os pensamentos motivadores que levam à prática de todas as virtudes, como à honestidade, à bondade, à justiça, à castidade, à humildade, ao circunspeção. A Bíblia mostra o coração como sendo símbolo da profundidade da personalidade humana, lá onde cada um se decide pelo bem ou pelo mal, por Deus ou pelo Maligno. Trata-se da realidade global do ser racional. A pessoa humana, que é uma alma que enforma o corpo e um soma que é enformado pela alma, possui em si, anterior aos diversos elementos que a compõem, um centro sublime que a Escritura sintetiza no termo coração. Este núcleo mostra a unidade psicossomática daquele que foi criado à imagem e semelhança de Deus. É daí que deve partir a abertura para o Transcendente e para as demais criaturas, sobretudo para o semelhantes. O progresso na perfeição física e psíquica dependerá exatamente da orientação que vem da sede dos sentimentos, das emoções, da consciência. Coincide isto com uma tomada de posição firme, correta, bem direcionada. Quem se curvar sobre si mesmo estará ao léu de todos os vícios que Jesus descreveu: “más intenções, imoralidades, roubos, assassínios, adultérios, ambições desmedidas, maldades, fraudes, devassidão, inveja, calúnia, orgulho, falta de juízo” (Mc 7, 21-23). É isto, conclui o Mestre divino, “que torna impuro o homem”. Portanto, um coração puro é o alicerce da gloriosa dignidade da pessoa humana. Deus dotou cada um com o dom maravilhoso da liberdade, exatamente para que Lhe seja dado um meritório “sim”, mas há a triste possibilidade de se dar um “não” ao extraordinário projeto divino de enobrecimento nas veredas das ações dignas e nobres. Está no Gênesis: "O Senhor viu que a maldade dos homens era grande na terra, e que todos os pensamentos de seu coração estavam continuamente voltados para o mal" (Gn 6,5). Deste modo o coração se torna o cerne íntimo que é sondado pelo Ser Supremo como bem o explicou São Paulo: "E aquele que perscruta os corações sabe o que deseja o Espírito, o qual intercede pelos santos, segundo Deus" (Rm 8,27). Asseverou São João:”Deus é maior do que nossa consciência e conhece todas as coisas” (1 Jo3,19). Aí está o motivo pelo qual Davi que havia se desviado do bom caminho pôde afirmar: “Um coração contrito e humilhado Deus jamais despreza”(Sl 50 (51), 19). Isto significa que há sempre oportunidade de se rever o relacionamento com o Ser Supremo, donde importantíssimo é o exame da consciência diário para que se afaste, de plano, tudo que pudesse enodar esta cela interior onde mora a divindade. Diz a Bíblia: “Feliz o homem a quem o Senhor não argúi de falta, e em cujo coração não há dolo” (Sl 31,2). Disto resulta a paz interior: “Pusestes em meu coração mais alegria do que quando abundam o trigo e o vinho” ( Sl 4,8). Nada, por tudo isto, pior do que a dureza do coração, condenada abertamente por Deus: “Não endureçais os vossos corações como em Meriba, como no dia de Massa no deserto, onde vossos pais me provocaram e me tentaram, apesar de terem visto as minhas obras (Sl 94,8-9). A importância da purificação foi bem compendiada por Jesus:”Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus” (Mt,5,8). Santo Tomás ensina que há dois tipos de pureza interior. A primeira prepara e predispõe para a visão de Deus e consiste na purificação da vontade afastando os afetos desordenados. A segunda é como que a realização e coroamento da visão de Deus, ou seja, é a pureza do espírito purificado das imagens ilusórias e dos erros, pronto para acolher as verdades divinas não como advindas do mundo exterior. Tudo isto merece reflexão profunda. * Professor no Seminário de Mariana de 1967 a 2008.

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